segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Cônica sobre o Natal

Em 2009 fui convidada a escrever uma crônica falando sobre o Natal na nossa família. Somos todos de Santa Luzia e lá se prima pelos belos presépios. A amiga disse que várias famílias haviam sido contatadas para escrever sobre o mesmo tema e que depois seria lançado um livro com a reunião de todas as crônicas. Ao final de 2010, o livro - Santa Luzia Uma cidade sob a luz do presépio - foi lançado e como prometido uma reunião de crônicas, porém ele teve apenas quatro autores, ou seja, seus idealizadores. Apesar disto, valeu a pena, pois, agora posso compartilha-lo com vocês e é muito bom ver um trabalho seu publicado. Espero que gostem.
Beijocas
Em tempo: A realização deste trabalho foi em conjunto com minhas tias, principalmente tia Mariza, a qual jamais teria conseguido escrever sem sua ajuda. O texto de tia Mariza foi publicado no livro, na íntegra.


O Verdadeiro espírito do Natal 
                                                    Carla Margareth Moreira Reis Queiroz

            Fui convidada por Nardeli para contar um pouco sobre nossas lembranças em torno do Natal, festa cristã, que comemora o aniversário de Jesus Cristo. Um resgate desta verdadeira tradição que aos poucos vêm “escapando” dos nossos lares. Confesso que não foi nada fácil chegar até aqui, até porque, todas as pessoas que poderiam contribuir para a montagem desta história, hoje, têm suas próprias famílias (filhos, noras, genros e netos... novas páginas da vida). Alguns já partiram deixando saudades: Vó Ceci, matriarca exemplo, Vô João, com seu assobio marcante e Tio Joãozinho; mas fui persistente e o resultado trouxe um gostinho de quero mais... de vontade de viver tudo aquilo que eles viveram....
  O convite proporcionou algo muito prazeroso: ouvir as histórias contadas por minhas tias e mãe. Mamãe lembrou com saudade da cesta de Natal que somente vô barracão (vô João) podia comprar e que todos aguardavam com enorme ansiedade... Era uma explosão de expectativas quando ele chegava. Lembrou também dos panos de presépio que faziam. Tia Maria lembrou das pastorinhas com saudade pelo encantamento daquele momento, que era esperado por todos com grande ansiedade... A simplicidade daquele grupo mágico e encantador (aproveito o momento para abrir um parêntese e parabenizá-la e ao seu marido, Tio José pelas Bodas de Ouro comemorada no dia 04 de Julho; feito raro nos dias de hoje. Obrigada pelo exemplo). Tia Marina, aventureira... adorava catar pedrinhas bem redondinhas na “praia” do rio das velhas para compor o presépio;  falou também do prazer que o evento proporcionava a todos... que maravilha! Tia Magda, a caçula, (dinâmica desde cedo), também participava dos preparativos, queria sempre ajudar em tudo. Mais tarde perpetuou a montagem do presépio com a arte e o carinho que trouxe daquela infância inesquecível; sua grande ajudante e companheira nesta montagem, agora, é a neta Mayara Cristina (minha afilhada). Conversando com tia Mariza ouvi que nosso saudoso tio João (Joãozinho barracão), menino pequeno naqueles tempos, também dava sua contribuição escolhendo os galhos, catando pedrinhas na beira do rio, socando e espalhando o esmeril sobre o pano... era uma aventura que ele curtia muito.
Eu e tia Mariza temos gostos muito parecidos. Adoramos a arte, a decoração... quantas não foram as vezes que ouvi dela:
- Vamos um dia montar uma casa que mexe apenas com bolos e decorações de festas?
Tia sei que este dia ainda chegará. Obrigada pelo carinho e confiança. Outro gosto comum entre nós é a facilidade e o prazer que temos em escrever e sendo assim quando procurei por ela, conversamos muito, mas ela preferiu escrever suas mágicas e saudosas lembranças, que abaixo reproduzirei fielmente.




NOSSO PRESÉPIO
                                    Mariza José Moreira Dalla Venezia
Que delícia! Que saudades!...
Pobres ricas crianças de hoje, que vivem do computador, celular, Orkut, Iphone, torpedos...

O mês de Dezembro para nós era mesmo uma delícia... Esperado com ansiedade. Começava com o aniversário de Maria, nossa primeira irmã. Canudinhos, cajuzinho, doce de leite, olho de sogra, cocadinha e banhado com muito guaraná, bolo... aquela festa.
Depois chegavam as férias, a festa de nossa padroeira Santa Luzia e até o Natal “um pulo”. Com ele antecediam os preparativos para montarmos o nosso presépio que começou quando minha mãe era criança, com o Menino Jesus que temos até hoje, dado por nossa bisavó.
Mamãe restaurava os sacos de aniagem, com os quais era montado o presépio. Todos nós participávamos. Maria, eu, Marina, Mara, Magda e até Joãozinho ajudava. Nossas tarefas eram variadas: socar o esmeril; quebrar a malacacheta que era guardada numa caixa sempre que se trocava a resistência do ferro elétrico daquele tempo; ir para o campo procurar galhos de árvores, frutas cheirosas e plantas exóticas; trazer areia; encontrar pedras bonitas, branquinhas, brilhantes ou redondas como batatinhas na praia do rio das velhas...
Vocês acham que acabava? Não, já pensando no presépio, íamos conferir a coleção de besouros, cigarras, borboletas que havíamos conseguido pegar durante o ano. Era a hora de conferir e selecionar as mais bonitas.
Também durante os últimos meses do ano, juntávamos latas retangulares de sardinha, bem lavadinhas e limpinhas, agora era o momento de furá-las, enchê-las de terra e buscar no moinho de Helena de Dadá, arroz com casca para plantar no dia 13 de dezembro. Plantando no dia 13, quando aproximasse o Natal já estaria tudo lindo e verdinho, e aí com o presépio pronto elas comporiam a lagoa de espelhos, dos patinhos, em harmonia com os musgos que colhíamos nos muros de Felício Vieira.
Seguíamos um verdadeiro ritual, todos envolvidos, procurando os materiais que seriam usados no presépio.
Tudo coletado e organizado, hora de montar o presépio.
Era uma tarefa inesquecível! Aproveitar o sol que aparecia antes do dia 13, para secar os sacos, por que depois era só chuva até o Natal.
Mamãe ia para a cozinha preparar o grude de polvilho... grudento, transparente e morninho. Nós com a supervisão contínua de mamãe, coloríamos a areia com anilina de diversas cores e mãos à obra. Espalhar o grude sobre os panos e sobre ele o esmeril, o cascalho, a areia branca, os cacos de vidro, a malacacheta... trabalhar com os dedos criando linhas sinuosas. Era um trabalho artístico, cada um mais lindo que o outro. E a turma vibrava!
Que saudades... escrevo e vivo cada detalhe. Prega daqui, monta dali, não troca a posição desta caixa, não esqueça da ponte dos reis, o lago dos patos, a grama dos carneiros... um cerimonial imperdível.
-Não esquece a estrela, o galo, o anjo com a faixa, as luzes, bota um alfinete aqui... cada hora era um que gritava algo que lembrava, um detalhe importante.
Tudo era maravilhoso, envolvente... esta é a emoção que agora corre em meus sentidos mas, havia algo de sumo importância que nos causava uma sensação gostosa... desembrulhar a Sagrada Família, pastores, carneirinhos, e os bichos de celulóide “japoneses ou chineses” que já havia naquele tempo e eram uma preciosidade, delicados, finos, perfeitos. Tudo sempre com a supervisão de mamãe, preocupada para não quebrarmos nenhuma peça, todas embaladas em papel de seda uma a uma e guardadas o ano inteiro numa caixa de madeira.
Sempre havia uma ou mais novidades quando começávamos a desembrulhar, pois, Ceci nossa mãe, era artista nata, de gosto apurado que adorava também viajar, quando retornava de suas viagens, sempre trazia algo diferente e guardava para criar expectativas durante a montagem do presépio.
Se faltava algo, ou se precisássemos inventar... sabíamos onde recorrer. Papai, João Barracão, comerciante de secos e molhados (sua venda havia de tudo, do querosene à seda pura), entusiasmado, fornecia todo o material e adereços, principalmente bichos novos.
Cada ano o presépio ficava mais bonito, diferente e rico.
Presépio pronto, ufa! Agora é esperar o Natal, pois, mãe colocava os presentes do “Papai Noel” aos pés do Menino Jesus.
Que festa! Que alegria! Que delícia!
Com o nosso presépio pronto, começava outra farra: visitar os outros presépios da cidade. Cada um mais rico e diferente que o outro, cada família inovava sempre, naquela época tão aguardada por todos. As visitas eram muitas, íamos a várias casas: de Dona Colo Viana, de Santa Dantas, das meninas de Antônia Marsal, das meninas da caixa d’água, de Dona Augusta Dolabela com o céu pintado, de Dona Idalina, de Dona Angelina Silva, de Zizi de Antônio, o da igreja Matriz, de Dona Altair e Deli Viana e de Dona Helenita, perpetuada até hoje, um patrimônio belíssimo!
Sem esquecer de levar uma moedinha de 1 tostão para cada presépio. Era obrigatório.
Nossa! Quase me esqueço... Hum! As rabanadas de mamãe (pão velho passado no ovo e frito empanado com açúcar e canela). Que delícia! Ceia, os presentes, os doces, a bacalhoada... Estou com água na boca... Que lembranças agradáveis!
Tempo alegre, feliz, saudável e inesquecível!
Depois do Natal, esperar pelo espetáculo das pastorinhas que é outra história...
Hoje mantemos a tradição de nossa saudosa mãe e cada uma das filhas e netas fazem o seu presépio, não tão lindo como aquele de nossa infância, mas que guarda a essência do amor, da saudade, da fé. Fazemos a novena de Natal e reunimos todos na casa de uma delas, revivendo nossa tradição.
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Foi emocionante receber e ler este texto produzido por tia Mariza. Ela deu vida à nossa história, cada pedacinho que lia, conseguia imaginar e até me deu uma pontinha de “inveja” e um desejo de revivê-lo... Quem sabe a partir daí não nasça uma nova história, tão repleta de fé, união, parceria, verdadeira infância e amizade.
Há mais ou menos 10 anos, nos reunimos todos na casa de nossa prima Liliana Cristina (filha de tia Mariza) e Álvaro que se esmera ao fazer com seu esposo, seus pais, filhas e irmã uma belíssima árvore de Natal e um presépio encantador. Antes da entrega dos presentes rezamos ao Menino Jesus e damos início ao nosso grande encontro familiar. Regado por uma bela e farta ceia, bons vinhos e o mais importante fé, união e alegria.
Obrigado senhor Jesus por contribuir em luz, para que dentro de cada um de nós perpetue e engrandeça o seu maior ensinamento... O AMOR.

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